sábado, 27 de outubro de 2007

MARJORIE, AMOR A PRIMEIRA VISTA! * de Marantbarfer

Marjorie, Amor à Primeira Vista!



Quando desci do pomposo veículo negro, nessa calçada tão antiga quanto arrogante, lembrei daquela praça imensa na Eslováquia. Há um ano atrás, meus olhos tensos cruzaram com os daquela mulher e desde então aquela visão não me abandona a mente.
Mesmo distante, do outro lado da praça como eu estava e ela dentro daquele ônibus sob a chuva, quando nossos olhos se cruzaram iniciou-se uma emoção irresistível e foi para mim como se estivéssemos a trinta centímetros um do outro. Até agora sinto em sonho seu perfume. Nossos olhos se mantiveram presos naquela emoção até que o ônibus se foi, levado pelo destino e pela onda clara, nascida daquela chuva forte, que como uma horda buscava direção.
Agora, atravesso essa definitiva porta, de estrutura leve em madeira, sem contudo tocar no vidro translúcido impecavelmente limpo, onde se pode ler o discreto anúncio Le Classic, que dá nome a esse restaurante. O homem acolhe meu casaco pesado e também meu chapéu de feltro inglês, sem sorriso, sem um olhar sequer, emitindo apenas uma imperceptível saudação obrigatória. Em toda a Europa me passam sempre a impressão de não gostarem de estrangeiros, notadamente os da América do Sul e os do Oriente e é comum que eu me sinta incomodado em ambientes públicos pelo tratamento dispensado, com exceção apenas dos locais de arte, como museus, teatros e em espetáculos populares, onde normalmente prestam atenção nos grandes astros e não nos transeuntes.

Aproximei-me da mesa reservada e tive um choque de impacto inenarrável.
Foi uma olhadela rápida, distraída e lá estava ela, vestida em sonho.
Curioso como em certas circunstâncias uma rápida olhadela pode ser detalhista, marcante, definitiva. Durou uma fração de segundos, mas eu poderia a partir daí narrar a quem quer que fosse os mínimos detalhes daquele rosto tão raro e particular. Opinar sobre aquela personalidade, tecer detalhes sobre o caráter daquela mulher tão distinta. Ah! Eu poderia sorver-lhe a alma com a ambição única de ser seu proprietário, como se isso fosse possível. Uma mulher como aquela é absolutamente auto-suficiente e está acima de tudo. Um homem honrado a serve e nada mais, que se dê por satisfeito.

Tem os olhos fundos, gritantes e com predominância para o azul, sobre um rosto magro e levemente moreno, que se mistura aos cabelos finos, negros, extraordinariamente bem perfumados, panoramizando um jogo perfeito.
É como se uma foto em preto e branco desse cores a apenas alguns detalhes de uma estampa formidável.
Os cabelos curtos parecem levemente molhados. As cores se acendem novamente para dar vez a lábios carnudos e apetitosos que emolduram uma boca rubra, com dentes alvos, firmes, que cintilam sadios a cada delicada intervenção que pronuncia. O nariz suave, porém altivo, denuncia a personalidade de marcante inteligência, requinte e bela formação.
Mulher adorável essa. Retilínea, de queixo angular com furo tão angelical, como os discretos das faces, abaixo da base de cada órbita, que se acentua nos movimentos de extremada simpatia, como nos leves sorrisos. O pescoço fino ostenta apenas uma tênue gargantilha de veludo azul-marinho, que sustenta a pequena medalha dourada que traz uma pedra rara e preciosa como detalhe.
Tudo isso se faz refletir nessas inesquecíveis e finíssimas vidraças, com o auxílio das muitas e famosas luzes, que habitam essa noite de Paris.
Está sentada razoavelmente oculta, do colo para baixo, atrás do biombo revestido em seda chinesa de tom verde musgo, que lhe protege a mesa, com extremado requinte.
Mas, mesmo assim, daqui eu lhe adivinho o corpo.

Num repente ela me olha. Meu coração treme. Seria eslovaca?
O que fazia naquele ônibus? Para onde ia? Lembra da chuva? Lembra de mim?

Seus olhos se desviam com suavidade e num repente voltam aos meus com expressivo brilho.
Ela sorri quando lhe mostro a taça do borbulhante champagne.

Estou feliz como uma criança enorme.
Começo a contar a história da minha vida agora, somente agora. Pois só agora nasci para a vida.
Seu nome? Agora eu sei. É Marjorie!

The End

Um comentário:

ComoHacerElAmor disse...

nossa !
simplesmente adorei!